segunda-feira, 26 de outubro de 2020

O ESPIRRO

 


Madalena, assim que entra na sala de espera do consultório médico, com mais 4 famílias já lá dentro, solta um espirro que “faz voar tudo para todos os lados”. Minha cara, de imediato, vai ao chão. Das faces mascaradas das pessoas, só noto os olhares assustados. Tensão no ar.

Peço desculpas a todos. Por conta da máscara, não sei se me ouviram muito bem, até porque não mostraram nenhuma simpatia pela “menina espirrenta” ou empatia à situação do pai.

Na hora trago a Madalena para o meu lado e nos sentamos, longe dos demais. Esbravejo (torcendo para que todos escutem) que ela precisa se lembrar de, sempre que for espirrar, cobrir a boca e nariz com o braço, antebraço ou, se der, o escudo do Capitão América (sim, nessa hora, tentei ser engraçadinho…em vão, aparentemente). Como espirro não é filho único, enquanto carrego no sermão higiênico, ela solta mais um! Este último, "mais volumoso", digamos assim...

Dou um pulo da cadeira, pego a ranhosa pelo braço e sigo a correr para a casa de banho.

Eu, entre limpar o nariz e voltar a lembrá-la (mais uma vez...) de levar o braço a frente da boca e nariz antes de espirrar, aguardava que o nome da Madá fosse chamado e saíssemos do lavatório direto para a sala do médico.

Não foi o que aconteceu. Voltamos para sala. Eu, cabisbaixo, evito cruzar olhares com as outras famílias. Vergonha, embaraço. Minha vontade é de caber dentro da mochila da Madá.

Ela? Criança, nem aí. Esfrega o nariz, funga, força a tosse, sorri. Parece gostar de me ver em desconforto. Não satisfeita, começa a dançar na sala. Passos largos, usa de toda a pista de dança (leia-se, sala de espera do hospital). Uma outra menina parece gostar da cena artística da Madalena. Não tarda e tenta levantar-se para dançar junto com minha filha. A mãe dela diz não, segurando o seu braço e cochichando algo no ouvido (provavelmente algo do gênero "sai de perto que aquela menina tem o bicho nela”). A menina se senta. Eu rogo para a Madá fazer o mesmo. Em vão.

A essa altura, claramente, eu estou nas mãos da minha filha de 4 anos e de sua gripe/virose. Os outros pais, enfim, parecem perceber minha condição de inferioridade. Eu torço para que sim. Que tenham pena de mim, que relevem a atitude involuntária da minha filha e que achem que ela está “somente gripada”.

A médica chama o nome da Madalena. Saímos da sala com o (meu) desejo de nunca mais encontrar aquelas pessoas na vida.

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