quinta-feira, 21 de maio de 2020

HOME OFFICE



Neste tempo de quarentena, terça-feira é igual à domingo, sexta-feira vale como sábado. Não há fim de semana, feriados são inúteis e a segunda-feira não é necessariamente o primeiro dia útil da semana. Home office, trabalho remoto e teletrabalho são nomenclaturas fofas para um regime insano: trabalhar confinado com as crianças.

Leio relatos incríveis nas mídias sociais de como as famílias se tornaram mais unidas com a quarentena. Fotos no Instagram de mães, com corpos atléticos, todas bem nutridas, correndo com seus 5 filhos nas lindas brumas e savanas. Imagens de pais a cozinhar um delicioso risoto de açafrão enquanto brincam de cavalinho com seus 8 filhos. Espetáculo. É o despertar de uma nova civilização, mais feliz, centrada na família e na sua comunidade. Só que este povo não deve trabalhar, pois não?!

Olha, eu tenho tentado arduamente ajudar na criação das crianças e na manutenção de um bom ambiente familiar, além de trabalhar. Confesso, existem bons dias, sim. Dias em que as coisas dão minimamente certo. Mas, existem dias como a última segunda-feira…

Acordei sabendo que precisava terminar uma planilha. Finalizar e formatar um banco de dados para um projeto importante. Mentalizei que a Paz teria de passar o dia em Lisboa, trabalhando. Ainda na cama, programei os horários para trabalhar, os horários para brincar com as minhas filhas, dar comida, o período da sesta (fundamental para o processo como um todo). Se tudo funcionasse como eu esperava, a segunda-feira poderia se “um daqueles dias que as coisas correm minimamente bem”.

Após uma boa manhã, que incluiu cansar ao máximo as minhas filhas, chegou a hora do almoço. Elas cansadas, era dar o almoço e colocar na cama. Porém, tal cansaço gerou um problema adicional: lentidão extrema em almoçar por parte da filha mais velha e uma birra histérica que culminou com uma aparente (e talvez forçada) falta de apetite por parte da mais nova. Findada a ceia, hora de pôr as duas para dormir!

Então, parto para um almoço rápido, seguido de um café e, então, era hora de sentar a frente da tela do computador e da bendita planilha. O silêncio…a paz…a tranquilidade. Porém, tudo que é bom dura pouco.

Carolina acordou cantando e pulando na cama. No rosto, umas marcas de picada. Maldita melga! Raquete de matar moscas em uma das mãos, Carolina na outra. Inicia-se uma caça descontrolada à inseto alado no quarto.

Presa encontrada, cheirinho de churrasco no ar. O caçador, de revoltado passa a extasiado com apenas uma “raquetada”. A vítima do mosquito, com seu rosto açoitado, parece feliz com os galopes ao colo do pai.

Com o barulho do ocorrido, Madalena também acordou. Pronto. A sesta, que poderia ter durado 3 horas, não passou de 1 hora. E esta única hora não foi o suficiente para o término da planilha. Era chegada a hora da criatividade.

Entre lanches e banhos de piscina, passaram-se duas horas (aquelas que eu precisava para trabalhar). A Madá seguiu a vida dela, a brincar com as primas. A Carol lembrou que era uma excelente oportunidade para passar mais tempo com o pai…

Sento-me para trabalhar enquanto ela fica a volta com as músicas. Corre para um lado, dança para o outro. Põe as mãos no rosto e abre a boca. Sono, cansaço, já sei. Não dura 2 minutos e ela já está grudada a minha perna. Diferente dos seres caninos, eu mexo a perna e ela não desgruda. E ela começa:

- Papai, papai, “uca” (que significa música em Carolês).

- Sim, querida.

Desligo a música da TV e ligo no meu computador. Sento ela na cadeirinha, ao meu lado, encho a mesinha de biscoitos e bolachas, coloco uma música do sapo qualquer e volto a trabalhar. Não tarda e ela:

- Papai, papaaaaaai!...”Ahaina” (aranha em Carolês).

- Ok, meu anjo.

Mudo para a música da dona aranha. A música, que não dura nem dois minutos, termina. Assim como o meu sossego.

- Paaaaaai!...Pela “cidadgi” (cidade em Carolês).

- Carolina. Então?! Já começará outra música. Espera.

- Paaaaaaaaaaaaaaai!...Pela “cidaaaaaaadgi” (cidaaaaaaaaaade em Carolês).

- Ô Carol, calma!

E lá fui eu achar a “música do autocarro” para ela. De modo a facilitar minha vida, já tratei de colocar uma série de músicas que ela gostava na fila. Enquanto isso, a planilha de Excel lá sozinha, só no AutoSave.

Volto à tabela. Hora de correr com o projeto.

- Papai!?...Pela “cidadgi” (já aprendeu, não é?)

- Ô diabo! Não! Chega desta música.

- “Cidaaaaaadgiiiiii!” (sim, você entendeu…)

- Não!

- “Chin” (sim em Carolês)!

- Carol!

- “Cidadgi”, “cidadgi”, “cidadgi”, “cidaaaaaaadgiiiiii”!

Fecho o laptop. Me levanto. Deixo-a falar sozinha. Caminho cabisbaixo para a cozinha. Abro o freezer, pego uma cerveja, procuro o abridor.

O primeiro gole ajuda a diminuir o zumbido estridente no ouvido esquerdo. O segundo gole ajuda a acalmar. O terceiro gole me dá ânimo para voltar a andar na direção da Carol. O quarto gole me dá forças para abrir o laptop. Não para voltar a mexer na planilha, mas para colocar a música da “cidagi”. Carol, então, ri com a boca larga e seus 50 dentes, manda beijos e dança com os ombros. O quinto gole é para abstrair do trabalho, que ficará para depois.

Um comentário:

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